Sexta-feira, 25 de Fevereiro de 2005
Em Suspiros
Sereia da praia, menina dourada,
encantam-me teus maneios engraçados,
quando finges não me veres...
Mas vês, eu sei isso quando brincas com a toalha,
no teu olhar repentino quando me focas e disfarças,
sinto-te embevecida por te cobrir com meus olhos,
já não tens postura, na areia para mim danças!
Peço-te um beijo de longe... voltaste-me as costas,
menina, sereia da praia, não esfarrapes meu peito,
queres que grite e brade ao mar a dor do meu querer-te?
Pego no Sol e no firmamento,
qual manto imenso de estrelas e perfumes,
e te entrego... pouso-o no teu corpo...
agora já me dás o sorriso que tanto suspiro!?
Carlos Reis
Terça-feira, 22 de Fevereiro de 2005
Poesia
Ostinato
Ao desejo,
à sombra aguda
do desejo,
eu me abandono.
Meu ramo de coral,
meu areal,
meu barco de oiro,
eu me abandono.
Minha pedra de orvalho,
meu amor,
meu punhal,
eu me abandono.
Minha lua queimada,
violada,
colhe-me, recolhe-me:
eu me abandono.
Eugénio de Andrade
Sexta-feira, 18 de Fevereiro de 2005
Silhueta
Sei de um olhar sorrateiro que se esconde atrás do sol,
finjindo vergonha quando sorri,
felina, a criatura deambuleia entre as ondas do mar,
vê-se que gosta dos salpicos da água no paredão,
que sustenta seu corpo dourado pelos raios de luz.
Só a consigo ver de longe, se me aproximo desaparece;
não pode ser, vejo-a de braços abertos abraçando o mar,
falar às ondas, trautear canções de embalar...
- Quem sois menina?
- Sou riso!... sou sombra do teu olhar!
Sempre que me queiras ver, olha o sol,
lá estarei para te sorrir e acenar!
Carlos Reis
Sábado, 12 de Fevereiro de 2005
Suave Vôo
Sinto-me gigante neste morro rodeado de estrelas,
sinto que erguendo as mãos pegaria na lua sorridente,
à minha frente!...
Ó lua, minha amante e confidente de noites sem sono,
em ti entrego meus sonhos, cantares da minha alma,
e no teu corpo escrevo os poemas perdidos,
que não disse às mulheres que amei por orgulho tolo.
Estou sôfrego de respostas dos afectos que me esqueci de dar,
e minha dor é dura agora... pelo receio,
de não ter gritado - como são lindos teus olhos amor;
-Como é bom ter a cabeça encostada no teu ombro,
onde o sossego encobre todo o pudor, todo devaneio!...
Só a ti Lua me desnudo dos meus temores,
Entende-me... quero tanto a quem quero,
que te digo, sinto-me gigante nestes momentos de alvores!
Carlos Reis
Quarta-feira, 9 de Fevereiro de 2005
Poesia
Passou a diligência pela estrada, e foi-se;
E a estrada não ficou mais bela, nem sequer mais feia.
Assim é a acção humana pelo mundo fora.
Nada tiramos e nada pomos; passamos e esquecemos;
E o Sol é sempre pontual todos os dias.
Alberto Caeiro
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REPLICO
Na areia onde te vi sentada, qual esfíngie morena,
meu olhar parou, tudo em mim se assombrou:
"Ó sombras de sombras douradas de inquietude,
é meu prazer ter-te como pintura feita de olhares meus,
teus longos cabelos dançando ao vento, nas minhas mãos,
meus dedos entrelaçados, nas quedas de água de teus caracóis,
Vão memorizar-te, eternizar-te, nas lembranças do meu...
EU!!!
Carlos Reis
Sábado, 5 de Fevereiro de 2005
Doce Alucinação
Sei de um sítio onde as flores nunca murcham,
é um canteiro semi-escondido em plumas verdes,
num rochedo da praia do Sol azul,
onde o som do mar faz eco de murmúrios que desconheço.
E que me acena sempre que lá passo com perfumes,
deixando-me sorridente, hipnoticamente sorridente...
Quando me liberto da sua teia enebriante,
lá sigo meu caminho cantando às estrelas.
Nunca me atrevi a descer à praia,
e subir o rochedo quando as flores bailavam;
Algo em mim me alertava da embriaguez da beleza do lugar,
e temia se o fizesse, de lá não voltar.
Contaram-me, que as vozes da noite contam:
"Que são tantos os sorrisos meigos e olhares felizes que,
de mui belo que é, fascinados já não voltam"...
Um dia cheio de coragem, pelo álcool da paródia da noite,
desci à praia e subi o rochedo,
e só encontrei um ninho de ave vazio,
estranhamente decorado com rosas e crisântemos verdes,
e seixos bem montados, quais antas propositadamente arranjados.
Deliciado com o cenário, sentei-me...
Acendi cigarro e por lá fiquei,
a ouvir as vozes do mar e os acenos das estrelas.
Carlos Reis
Terça-feira, 1 de Fevereiro de 2005
Poesia
Não tenhas nada nas mãos
nem uma memória na alma,
Que quando te puserem
nas mãos o óbolo último,
Ao abrirem-te as mãos
nada te cairá.
Que trono te querem dar
que Átropos to não tire?
Que louros que não fanem
nos arbítrios de Minos?
Que horas que te não tornem
da estatura da sombra,
Que serás quando fores
na noite e ao fim da estrada.
Colhe as flores mas larga-as,
das mãos mal as olhaste.
Senta-te ao Sol. Abdica
e sê Rei de ti próprio.
Ricardo Reis
É sempre uma boa aventura passear contigo
meu caro Pessoa,
ver as coisas pelos teus olhos argutos e tristes,
singularizar os detalhes, aparentemente, mais banais,
subir ao teu altar-mor de pensar,
ouvir-te em retóricas de egos e paixões,
onde as emoções ganham fulgores em mim desconhecidas.
Penso que penso como tu... ai a minha ousadia...
Não leves a mal companheiro porque é fácil sonhar,
contigo ao meu lado sempre que vamos passear!
Carlos Reis